quinta-feira, 22 de março de 2012

Diego Ballestero

Foi em Espanha, ao ler a "La Marca" que tive conhecimento deste senhor.
Por vezes queixamo-nos de tão pouco...
Como posso queixar-me?
Como?
Poucos dias depois da alta ele concedeu uma
breve entrevista a um meio de comunicação de seu país. Então, vamos à
entrevista:
Diego Ballesteros, na cadeira de rodas depois de
um acidente de bicicleta
"Como posso me queixar?"
A quanto tempo na cadeira de rodas?
Desde junho passado, quando sofri o
acidente.
Que aconteceu?
Competia na Race Across América: pela primeira
vez participava uma equipe espanhola, éramos quatro ciclistas...
Em que consiste essa competição?
Em cobrir 5.000 quilômetros de bicicleta,
cruzando o Estados Unidos de oeste a este, mediante relevos. Na Rodovia de
Wichitta, um carro me atropelou.
Por detrás?
Sim. Ainda que eu pedalasse por una faixa muito
larga, um jovem de 20 anos se distraiu revirando do porta-luvas e me
atropelou.
Que lesões você sofreu?
Eu avançava a 30 km/h, e ele, a 100 km/h: voei
três metros, rompi as duas cabeças dos perônios, a cadeira, quatro costelas,
duas vértebras esmagadas e duas vértebras quebradas.
Ufa!.
Não perdi os sentidos... Minha condição física
de esportista me salvou, disse o médico.
A quanto tempo praticava esportes?
Toda vida: tênis, futebol, atletismo, maratona,
escalada, esqui de travessia e, finalmente, bicicleta por longas
distâncias.
Qual foi sua maior conquista?
Em 2008 pedalei 12.822 quilômetros em cem dias
(128 quilômetros por dia), desde a Expo de Zaragoza até os Jogos Olímpicos de
Pequim, em condições extremas.
O que foi mais difícil?
Uma ventania em Mongólia: ela me atirava nas
pedras, me derrubava da bicicleta. Ou temperaturas de 51ºC na depressão de
Turfan...
E o melhor?
Dormir debaixo das estrelas do deserto. E o
carinho das pessoas pelo caminho. Fiz amigos para sempre, como Josan, que me
acompanhou por dois dias; como León, que me hospedou em sua casa na Servia; como
Mike, que pedalou a meu lado pela China... Chorei ao entrar em Pequim. Realizei
meu sonho!

E com que sonha agora?
Com voltar a ser professor do instituto,
casar-me, ter filhos... E rodar de bicicleta de três rodas, pedalando com as
mãos.
Que dizem os médicos?
Uma negligência pós-operatória ali ocasionou
isquemia da medula espinhal: morta até a vértebra cervical-6, meus músculos não
respondem do peito para baixo.
Não existe recuperação possível?
Jamais moverei nem abdomem nem pernas.
E em que consiste a reabilitação que você
fez no Institut Guttmann?
Me ensinaram a me valer por mim mesmo: me
vestir, passar da cadeira de rodas ao vaso sanitário, me levantar do chão,
superar obstáculos com a cadeira... Tratar-se de ser autônomo.
É duro?
Duríssimo. Incluidas umas paralelas para estar
na vertical... ¡Mas é a melhor sensação do dia: voltar a estar de pé! E favorece
a circulação sanguínea e combate a osteoporose.
Com que mais sonhas?
Passear pelo bosque, pelas montanhas do Pirineo
de Huesca, perder-me entre as árvores do Somontano, procurar pelas setas
indicativas... Porque na cadeira de rodas já sei que não poderei...
Como está seu ânimo?
Minha namorada foi muito importante,
psicologicamente: depois do acidente, propus terminar nossa relação. Porém, me
respondeu que ela estava apaixonada por mim, não de minhas pernas... E está ao
meu lado! Conservar meu entorno afetivo foi decisivo.
Me dizia que querem ter filhos...
Sim, daqui há alguns anos, quando tenhamos
assumido esta nova vida... Existem métodos de fecundação com meu próprio
esperma…
Não pode ser mediante sexo
convencional?
Sou flácido do peito para baixo. Existem
medicamentos que podem me facilitar uma ereção, mas ao carecer de sensibilidade,
fica impossível ejacular.
Que planos tinhas justo antes do
acidente?
Cruzar Canadá de bicicleta, sozinho. Mantenho
esse sonho, claro, pois tenho a ilusão de voltar a viajar, fazer
esporte...
Como você se mentaliza para não cair em uma
depressão?

Penso no agora, não no passado, e procuro que o
presente seja o mais pleno possível. Agora escrevi um livro sobre minha viagem
Zaragoza- Pequim, veja.
Você conversou com o rapaz de 20 anos que te
atropelou?
Não quis vê-lo. Que diria a ele? Todos nós nos
descuidamos alguma vez, Eu já o perdoei... porque, adiantaria ficar de frente a
frente com ele, identificar a um culpado? Não acredito...
Você se arrependeu alguma vez por ter ido à
Race Cross América?
Não. Porém de uma coisa estou certo: nada de
competir com poucos meios, sem garantir ao máximo a segurança! Tem que ficar
claro isso!
Caem muitos ciclistas na
rodovia...
Sim. Por favor, motoristas: um ciclista pode
incomodar, mas sua vida está em tuas mãos!
Até quando estará em reabilitação?
Já tive alta e volto a me instalar em casa, em
Barbastro.
Como tens passado esses seis meses
aqui?
Não estou tão mal: há companheiros de
reabilitação com lesões cerebrais... ou medulares mais graves. Fiz um amigo,
Alberto, paralizado do pescoço para baixo por um acidente: sua esposa acaba de
lhe dar gêmeas, e ele... Ele daria tudo para poder acariciá-las... Como posso me
queixar? Como?

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